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Índice Multicritério de Sustentabilidade na ResEx Chico Mendes, Acre – Brasil

O artigo avalia a sustentabilidade teritorial com base no conceito de Carbono Social e na Análise Multicritério de Apoio à Decisão (MCDA). O diagnóstico de sustentabilidade baseou-se em cinco critérios: governança, ambiental, social, econômico e agronômico; os quais foram hierarquizados e ponderados através de conferências de decisão junto aos atores sociais, gerando o Índice Multicritério de Sustentabilidade.

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Abelhas nativas amazônicas e polinização do cacau

O cacau (Theobroma cacao) é um negócio multibilionário. Essa cultura tropical depende muito da polinização animal para o desenvolvimento dos frutos e a produção de sementes. A falta ou a ineficiência dos polinizadores naturais nas plantações de cacau levou os agricultores a buscar alternativas, como a trabalhosa polinização manual.

Uma alternativa até agora não testada, que tem recebido cada vez mais atenção nos últimos anos, é a polinização direcionada de culturas por meio de abelhas nativas manejadas. No entanto, devido à pequena dimensão das flores do T. cacao, bem como às barreiras estruturais que impedem o acesso de insetos grandes ao estigma, apenas abelhas minúsculas podem ser uma opção viável para a polinização direcionada do cacau. No presente estudo, investigamos se as pequenas abelhas sem ferrão (Apidae, Meliponini) poderiam ser consideradas como polinizadores gerenciados da cultura do cacau, especialmente em agroflorestas sombrias.

Entre as 188 espécies de meliponíneos nativas da região amazônica brasileira, que compreende uma parte importante do centro de origem de T. cacao, selecionamos 52 espécies com base em critérios morfológicos (distância intertegular ≤ 1,4 mm; comprimento do corpo: 2,2-6,0 mm). Importantes para a produção de cacau, alguns desses Meliponini têm ampla distribuição geográfica, ocorrendo tanto no centro de origem da T. cacao quanto fora dele (centros de produção de cacau no Brasil: Pará: 35 spp., Bahia: 10 spp.).

Presumivelmente, todas as espécies podem estar ativas em níveis de iluminação abaixo daqueles encontrados em plantações de cacau muito sombreadas, pelo menos nos momentos em que as anteras apresentam deiscência total e durante a receptividade máxima do estigma. O potencial das abelhas para forragear em regimes de luz reduzida é corroborado pela constatação de que entre 20 e 60% das fontes de alimento exploradas naturalmente são vegetação rasteira, incluindo ervas, subarbustos, arbustos e cipós.

Muitos dos Meliponini selecionados constroem seus ninhos, pelo menos facultativamente, em cavidades de árvores, o que facilita sua transferência para colmeias racionais e, portanto, o uso de colônias gerenciadas na polinização direcionada de culturas. As próximas etapas importantes para validar o potencial dessas pequenas abelhas sem ferrão na polinização direcionada do cacau devem incluir estudos detalhados sobre seu comportamento de forrageamento e capacidade de aprendizagem olfativa.

O artigo publicado na revista Frontier pode ser consultado em: https://www.frontiersin.org/journals/bee-science/articles/10.3389/frbee.2024.1357811/full

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Como salvar vidas na Amazônia

Por Jacques Marcovitch, professor sênior da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da USP, e Adalberto Luiz Val, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações. Publicado em 08/08/2024 no Jornal da USP

Jacques Marcovitch
Foto: IEA/USP
Adalberto Luiz Val
Foto: IEA/USP

Milhões de vidas estão em situação de risco iminente na Amazônia, conforme alertas da Fiocruz e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Dois temas, insegurança alimentar e insegurança pública, estão aqui apresentados lado a lado, porque revelam interdependência: para a descontaminação dos rios, a preservação ambiental e a garantia do bem-estar da população, é essencial a erradicação da violência e o combate ao crime.

Insegurança alimentar

O relatório da Fundação Oswaldo Cruz, coordenado pelos cientistas Paulo Cesar Basta e Sandra de Souza Hacon, é um guia para estudos imediatos. Todos os dias, milhões de habitantes ribeirinhos da Amazônia, um dos maiores ativos ambientais do planeta, se nutrem de alimentos contaminados. O peixe, sua alimentação básica e cotidiana, é contaminado pelo mercúrio despejado nos rios que atravessam a região. Morte lenta e gradual, ocasionada por mãos assassinas de bandidos em busca de ouro. Para facilitar seu trabalho, os garimpeiros ilegais derramam esse metal líquido prateado, denso e fatal, nas principais reservas de água doce do mundo.

Imagens captadas pela organização MapBiomas revelam que as bacias mais afetadas pelo assoreamento dos rios e contaminação das águas foram as do Amazonas (o famoso rio-mar), Tapajós, Teles Pires, Jamanxim e Xingu. Em 2022, o garimpo ilegal teve um incremento de 265% em relação aos anos anteriores. Isso significa uma área de 35 mil hectares. Para que se tenha ideia da monumentalidade criminosa, basta dizer que as leis ambientais brasileiras não permitem que cada concessão ultrapasse cinquenta hectares. Isso mesmo, apenas cinco dezenas. Mas, durante quatro anos, todas as leis e multas foram, na prática, anuladas.

Quatro instituições – Fiocruz, Instituto Socioambiental (ISA), Instituto Evandro Chagas e Universidade Federal de Roraima (UFRR) uniram-se em um estudo sobre a contaminação dos rios no território indígena Yanomami. Os peixes recolhidos em vários pontos da bacia do Rio Branco tinham concentrações de mercúrio bem maiores ou no limite fixado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO). Foi detectado que os peixes barba-chata, coroataí, filhote, piracatinga e pirandirá, carnívoros, apresentam riscos elevadíssimos, e deles somente podem ser consumidos cinquenta gramas, uma vez por mês. Também apresentam alto risco os peixes dourado, mandubé, pescada, tucunaré e piranha-preta, requerendo baixo consumo.

Em síntese, a presença de garimpos em terras indígenas não traz riqueza e desenvolvimento às comunidades. Pelo contrário, deixa um legado de enfermidades e problemas ambientais que contribuem para perpetuar o ciclo de pobreza, miséria e desigualdade na Amazônia.

O que fazer?

O que é urgente e efetivo é a proteção integral dos rios. Isso quer dizer aumento da fiscalização, bloqueio das vias de acesso do garimpo, destruição das pistas de pouso, veículos e maquinário dos infratores, além de prisão em flagrante. Estas práticas, naturalmente, devem ser levadas a efeito em paralelo com a busca de tecnologias limpas.

Por meio do Global Mercury Partnership, almeja-se a disseminação de boas práticas para a descontaminação das águas na região. Merece destaque a experiência praticada nos arredores do Tapajós, onde os mineiros locais são treinados visando à redução do uso do mercúrio e à recuperação ambiental.

Instituições do saber científico no Brasil unem-se na defesa da Amazônia. USP, UFPA e Inpa e abordam no Pensa Brasil 2024 as questões levantadas e outros desafios na região. A Embrapa Florestas, a Unicamp, a UFMT, a UEM e a Coogavepe pesquisam os efeitos de quatro bioextratos produzidos a partir de uma árvore nativa da Amazônia, conhecida como pau-de-balsa (Ochroma piramidale) como tecnologia livre de mercúrio na mineração de ouro.

Em complemento, pesquisadores da Chalmers University of Technology, na Suécia, conceberam um processo eletroquímico para tratar rios contaminados por mercúrio. A solução está em um eletrodo que atrai para si os metais pesados e purifica as águas. O novo método torna possível reduzir as impurezas em 99%. O trabalho foi publicado na revista Nature Comunications.

No que se refere à saúde, é preciso incluir médicos que abordem os efeitos da exposição crônica e aguda ao mercúrio, especialistas em saúde pública que analisem padrões de grandes populações e sociólogos e antropólogos que estudem os impactos decorrentes da prospecção e extração de ouro.

Insegurança pública

Na Amazônia brasileira, o cenário é preocupante e exige uma política de segurança pública em condições de cortar o mal pela raiz. Um desses estudos é Cartografias da Violência na Amazônia. Apoiado em mapas, quadros, gráficos e tabelas repletas de informações auditáveis, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública aponta o território em disputa neste infernal mercado de violência, suas dinâmicas, redes, efeitos ambientais e sociais e capacidades a explorar para o seu urgente enfrentamento. A invasão do crime organizado ocupou 23% do território da Amazônia Legal, adotando procedimentos iguais ou até mais nocivos do que aqueles que essas mesmas facções aplicam nas favelas metropolitanas.

Este relatório oferece indicadores preocupantes: nas cidades caracterizadas como “urbanas” da Amazônia, a taxa de mortes por violência é de 35,1 por 100 mil habitantes, 52% a mais do que a média nacional, enquanto nos municípios ditos “rurais”, por sua proximidade ao campo, a taxa média de homicídios superou em 38% a média do País, chegando a 31%.

O feminicídio fez-se rotina na Amazônia e exige combate por todos os meios, que convergem, na justa medida, repressão, educação e, sobretudo, ações preventivas, além do pronto apoio às vítimas em situação de risco. Nos municípios amazônicos, este crime apresenta uma taxa de 1,8 para cada 100 mil mulheres – superior à sinistra média nacional, de 1,4 por 100 mil.

O que fazer?

Quando se fala em Política Nacional de Segurança, é imperiosa a urgência de um modelo específico para tratar os conflitos da Amazônia. A região, por suas peculiares características geográficas, econômicas, sociais e culturais, é como um país à parte, exigindo normas próprias, embora emanadas, como estabelece a Constituição, dos mesmos poderes centrais. Trata-se de um ecossistema a ser monitorado com dados mais precisos sobre demografia, trabalho e condições de vida, rastreabilidade e acesso aos benefícios por parte das comunidades das florestas dedicados à bioeconomia de produtos não madeireiros. A experiência de uma “Casa de Governo”, instalada para monitorar as invasões de garimpeiros, poderia ser replicada no território amazônico para desconstruir as ações do crime organizado.

Conclusão

Promover o bem-estar humano e a conservação da natureza na Amazônia é a missão da Estratégia Nacional de Bioeconomia, instituída no Decreto 12.044 de 5/6/24. Trata-se de uma estratégia para o fortalecimento das cadeias de valor sustentáveis, visando estimular atividades geradoras de emprego e renda para os habitantes da floresta, permanentemente ameaçados pelo crime organizado e envenenados pelo mercúrio espalhado nos rios. A implementação da Estratégia Nacional de Bioeconomia depende da articulação de esferas de governo, incluídos os órgãos responsáveis pela segurança pública, com organizações da sociedade civil e entidades privadas. Uma articulação que exige governança adequada para eleger prioridades, determinar responsabilidades e selecionar métricas de monitoramento para a ampla divulgação dos seus resultados e impactos.

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